Ano XIX nº 220 -
 
 

Artigo - Maria Lucia Zarvos Varellis

Edição 220 - 26/02/2016

 

 

Inclusão da pessoa com necessidades especiais:

VOCÊ TEM FEITO A SUA PARTE?

 

A pessoa com necessidades especiais, antes de ser um indivíduo que precisa de algum tipo de apoio - temporário ou permanente, é um ser humano que tem garantido pela Constituição Federal o seu direito de ir e vir. Mas, será que a sociedade garante esse direito? Quando pensamos em necessidades especiais nosso imaginário percorre caminhos tortuosos e que, na maioria das vezes, nos leva ao erro de estereotipar as pessoas que têm necessidades especiais de acordo com as suas impossibilidades.

Entretanto, a realidade vai muito além de simples rótulos que determinam o que um ser humano pode ou não realizar, ainda que este tenha uma forma diferente da grande maioria das pessoas que o cercam.

Repensando o conceito de inclusão, vale lembrar que a sociedade deve perceber a existência de pessoas com deficiência e se organizar para acolhê-las, uma vez que as mesmas já tomaram consciência dos seus direitos enquanto cidadãos e reivindicam seus espaços, ao exercer a sua cidadania. Assim, o conceito de inclusão traz para dentro o conjunto de pessoas que já fazem parte dele e a sociedade deve estar organizada para receber o diferente.

O fato dessa mesma sociedade não ter sido preparada para conviver com as diferenças, torna esse processo de inclusão mais demorado. Não são apenas os aspectos de saúde e educação que exigem que esse olhar seja mais delicado, mas, a meu ver, o principal de todos é a necessidade da implantação do desenho universal, que diminuiria as barreiras arquitetônicas, que tanto limitam o direito de ir e vir, garantido pela constituição, a todos os indivíduos.

Essa dificuldade fica clara na fala da professora Edna Antonia de Mattos, doutora pela Faculdade de Educação da USP, que diz “a sociedade tem uma visão de homem padronizada e classifica as pessoas de acordo com essa visão.

Profa. Maria Lucia
Zarvos Varellis

A profa. Maria Lucia Zarvos Varellis é cirurgiã-dentista (USP) e especialista em Odontologia para Pacientes com Necessidades Especiais. Foi membro da Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde do Ministério da Saúde (2010 – 2011) e consultora da Organização Pan-Americana de Saúde (2010 – 2011). É autora do livro Odontologia para Pacientes com Necessidades Manual Prático - Editora Santos, colaboradora do Protocolo de Especialidades em Saúde Bucal do Ministério da Saúde para Atenção Básica, 2008, coordenadora do Fórum dos Conselhos Fim Saúde do Estado de São Paulo, membro do Grupo de Trabalho Interprofissional da Saúde - Secretaria de Estado da Saúde desde 2014 e presidente da Comissão de Registros de Técnicos de Saúde Bucal e Auxiliares de Saúde Bucal do Conselho Federal de Odontologia.

 

Um padrão de normalidade é escolhido e nos esquecemos de que a sociedade se compõe de homens diversos, que ela se constitui na diversidade, assumindo de outro modo as diferenças”.

A Unesco diz que “a deficiência é uma dentre todas as possibilidades do ser humano. Por isso deve ser considerada, mesmo que causas e consequências se modifiquem, como um fato natural, que nós mostramos e de que falamos, do mesmo modo que o fazemos em relação a todas as outras potencialidades humanas".

Howard Gardner, em 1993, descreveu duas inteligências, que somadas às outras sete já descritas por ele anteriormente, formam o conjunto das nove inteligências múltiplas, que nos ensina que nenhum indivíduo é totalmente desprovido de alguma elas e que quando bem trabalhadas, elas podem facilitar o processo de inclusão social daqueles indivíduos considerados “diferentes”.

Vale destacar que as pessoas além da Classificação Internacional de Doenças (CID), que leva em conta o dano, a Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF), adotada a partir de 1999 permite perceber as potencialidades que o indivíduo teve preservadas à revelia do processo de “doença” e facilita que o mesmo se reintegre à sociedade.

Recordo-me do cirurgião-dentista Joon Sok Seo, com quem pude conviver por algum tempo e que, quando criança, ingressou na hidroterapia para tratar de sua limitação de locomoção em razão da sequela de poliomielite. Joon sempre disse que não gostava de sentir que as pessoas o estigmatizavam por aquilo que as suas pernas não podiam fazer. Ele queria que vissem o que era capaz de fazer com os braços. Entre outros prêmios, Joon conquistou no Parapanamericano de Mar Del Plata, em 2003, a medalha de ouro no revezamento 4x50m livre e a de bronze, nos 50m borboleta e 50m costas. Foi também medalha de prata nas Paraolimpíadas de Sydney e Atenas, em 2000 e 2004; Bronze no Meeting Internacional e no Parapan Rio2007; ouro, prata e bronze no Mundial de IWAS no Rio, em 2005; e ouro, prata e bronze no Mundial de IWAS na Nova Zelândia, em 2003. Ganhou também o bronze no revezamento 4x50m na Paraolimpíada de Pequim, em 2008.

Podemos constatar essa mudança no panorama de nossa cidade ao observarmos pessoas como Mara Gabrilli, a vereadora mais votada da cidade de São Paulo e deputada federal, tetraplégica; Alan Cortez de Lucena, advogado, paraplégico; Roberto Beleza, membro da Comissão Permanente de Acessibilidade do Município de São Paulo e da Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida de São Paulo (SMPED); Rodrigo Mendes, superintendente do instituto que leva seu nome e que disponibiliza um projeto inclusivo para pessoas interessadas em arte a partir dos 14 anos; Ricardo Hodish - engenheiro de produção, paraplégico -, Silvana Serafino Cambiaghi - arquiteta e paraplégica especialistas em acessibilidade - e Cid Torquato, advogado, paraplégico, ex- coordenador de relações institucionais da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo e atual secretário adjunto da mesma secretaria.

Como podemos observar temos várias pessoas com necessidades especiais inseridas na sociedade, produtivas e ocupando cada vez mais lugares de destaque no mercado de trabalho.

Fica então uma pergunta: o que a categoria dos cirurgiões-dentistas tem feito para possibilitar esta inclusão social?

A resposta é a de que temos enfrentado várias lutas em prol da inclusão e ampliação no acesso ao tratamento odontológico de pessoas com necessidades especiais. Desde 2001, quando a especialidade foi reconhecida pelo Conselho Federal de Odontologia - CFO, vários cirurgiões-dentistas se especializaram na área – hoje somos, segundo dados do CFO, 560 no país, dos quais 181 estão no Estado de São Paulo. Um de nossos objetivos é que a disciplina de Odontologia para Pacientes com Necessidades Especiais volte a integrar o currículo de graduação das universidades, para que os profissionais formados estejam habilitados a atender esse universo que hoje é de cerca de 45,6 milhões de pessoas - 23,9% da população; cerca de 38.5 milhões de deficientes vivem em áreas urbanas e 7.2 milhões vivem áreas rurais. De acordo com o último censo 18,8% têm deficiência visual; 7%, deficiência motora; 5,1% deficiência auditiva e 1,4% deficiência mental/intelectual (Fonte: jornal O Estado de S. Paulo, 2010).

O conceito de humanização pressupõe a oferta de atendimento de qualidade, articulando os avanços tecnológicos com acolhimento, melhoria dos cuidados e das condições de trabalho dos profissionais. Se cada um de nós fizer a sua parte, poderemos reconstruir um mundo no qual sentimentos, crenças e valores sejam respeitados. Assim a humanização estará inserida no processo, sendo parte essencial do mesmo. A consequência dessas ações será um mundo em que as diferenças, pouco a pouco, deixarão de ser sentidas como obstáculos para obtenção da excelência nos serviços oferecidos aos pacientes com necessidades especiais.

Eu estou fazendo a minha parte! E você? Está fazendo a sua?

Junte-se a nós! Dê mais um passo e abrace esta causa! O mundo agradece!

 

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