E dição
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- 14/12/2017
Espaço Instituto Pedro Martinelli
Entrevista exclusiva
Prof. Dr. Fernando Luiz Brunetti Montenegro
Odontogeriatria: Brasil tem 17 milhões de idosos,
mas apenas 350 CDs especialistas na área
Por Zaíra Barros*
Levantamento do IBGE (2016) aponta que o Brasil tem 17 milhões de
idosos. Como anda a saúde bucal dessa enorme faixa de população que
exige muitos cuidados para ter uma vida equilibrada e saudável?
Apenas 350 cirurgiões-dentistas são especialistas em Odontogeriatria
(ODG). Para o prof. Fernando Luiz Brunetti Montenegro (foto), mestre e
doutor pela USP, coordenador de cursos de Especialização em Odontogeriatria na ABO-SP e na Abeno, especialista em Prótese e
Periodontia, coordenador de Odontogeriatria em cinco sites gratuitos
da internet, autor de 125 artigos publicados sobre o tema no Brasil
e no exterior (92 deles publicados no Jornal Odonto na coluna
Odontogeriatria a um Clique) e consultor do Instituto Pedro
Martinelli (IPM). Com este currículo, o prof. Brunetti foi o
escolhido para a primeira entrevista e matéria especial do Espaço
IPM - Com a palavra o cirurgião-dentista. Ele fala de cátedra e é um
dos mais atuantes na defesa da especialidade e da saúde bucal dos
idosos. Brunetti explica que a falta de dentistas interessados na área
se deve ao fato da Odontogeriatria ter sido reconhecida pelo CFO em
2001, portanto considerada ainda nova frente às tradicionais
disciplinas clínicas e sofre o resultado da falta de estímulo nos
bancos universitários.
Reconhecida, mas não obrigatória -
“Além do mais, prossegue, foi reconhecida a especialidade em 2001
mas o MEC não a considera obrigatória no currículo”.
Depois, explica, “principalmente porque o quadro acadêmico é de
demissão de docentes, de diminuir cadeiras como ocorria nas décadas
passadas, e fazer, desde o 2º ano, uma enorme clínica integrada”.
Nessa clínica, explica o prof. Montenegro, quem vai falar de
Odontogeriatria não é uma pessoa conhecedora a fundo na área e sim
um professor voltado às diversas cadeiras clínicas, sem contar o
atual número elevado de alunos por turma devido aos financiamentos
universitários e sem a contratação de novos docentes para melhor
atender alunos e pacientes. Esta é uma questão complexa, tanto para
o aluno como para o professor, destaca. Para o aluno, que acaba não
tendo motivação dirigida para se especializar na ODG. Para o
professor, que tem de desdobrar-se entre diversas atividades
clínicas e teóricas e não coloca foco em uma em particular, pois o
objetivo maior tem sido “acabar” com as estruturas de cadeiras, como
sempre foi nas décadas passadas.
Baixa condição social -
“Na
prática, o perfil deste professor é aquele que se interessa pela
área mas sua carga horária não aumenta por causa disso, nenhum
incentivo é agregado ao seu esforço”, destaca Brunetti. Soma-se a
isso a baixa condição social da população, com salário mínimo para
70% das aposentadorias e gastos de moradia, alimentação, remédios.
Quem consegue viver com isso e ainda visitar o dentista? A condição
social afeta diretamente a saúde bucal dos idosos (veja quadro 1,
sobre edentulismo no Brasil).
Quadro1
Quadro 2
Especialidade presente em 30% das faculdades -
“O
que vejo, no entanto, é falta de conhecimento tanto dos alunos e até
mesmo dos cirurgiões-dentistas, pois ambos não recebem informações
corretas da ODG nos bancos acadêmicos e de pós-graduação”,
prossegue. A disciplina de Odontogeriatria está presente em
apenas 30% das faculdades brasileiras, em 18 delas é optativa e em
63,2% não está na grade ou no site das próprias escolas (Quadro 2 Site CFO e
sites das escolas). Na mesma base de dados, consta que a Disciplina
é optativa em 10 universidades particulares e em 8 escolas estatais
brasileiras.
Por outro lado, muitos CDs, de todo o Brasil, pensam que a Odontogeriatria se restringe a próteses totais e não perceberam,
ainda, que mais e mais pessoas de meia idade estarão em breve
chegando à terceira idade com muitos dentes na boca e isso obrigará
a um novo enfoque clínico, pois terão doenças decorrentes ao passar
dos anos, que implicam nos atendimentos clínicos e cirúrgicos. Esses
idosos podem ter mais hemorragias, maior incidência de problemas
periodontais em face de diabetes descompensadas, menos quantidade de
saliva na boca, devido à quantidade de medicamentos que tomam,
maiores cuidados com a parte cardíaca e o número de anestesias a
ministrar, entre outros problemas. Nos idosos de hoje, mais de 50%
têm falta de dentes total na boca, mas dentre os adultos de hoje,
eles não apresentam um quadro dentário tão ruim e, portanto, será um
vasto contingente de pessoas que chegarão à terceira idade
demandando uma Odontologia que não foi ensinada nos bancos
universitários. Esta parte da população receberá um tratamento
abaixo de suas necessidades ou expectativas, por desconhecimento
por parte da grande massa de dentistas sobre as características clínicas
voltadas ao atendimento de pacientes idosos com implicações
sistêmicas significativas.
Portanto, face à sua condição sistêmica de saúde, o idoso dentado,
especialmente nas cirurgias bucais, tem de ser visto com a
profundidade clínica dos problemas que apresenta hoje e não como um
simples idoso saudável. Isto deveria ser ensinado numa Cadeira de
Odontogeriatria bem estruturada e durando de 6 meses a um ano, no
penúltimo ou último ano de formação.
Especialidade rentável? “Sob
o aspecto da profissão, defendo que a Odontogeriatria poderia ser
uma especialidade rentável, ainda mais se existisse nas faculdades,
nos cursos de especialização e de atualização e nos convênios
odontológicos uma realidade clara sobre os dias atuais, onde o
contingente de idosos cresce para além de 17 milhões de indivíduos”, aponta Brunetti.
“Infelizmente, esta não é a nossa realidade e quem mais sofre com
isso é a população idosa, principalmente a de mais baixa condição
econômica. Os idosos vivem mais hoje, vivem melhor mas apenas se
tiverem boa condição financeira. A grande parte deles continua
desassistida. O Brasil e a Odontologia deveriam estar se preparando
para o que vão enfrentar pela frente: hoje são 17 milhões mas em
2030 serão 31.8 milhões de pessoas acima dos 65 anos (fonte IBGE
2010-2017). Quem estará preparado para atendê-las?”, lança o desafio
o especialista Brunetti.
Leitura sugerida sobre o tema:
Montenegro FLB, Marchini L
Odontogeriatria: uma visão gerontológica. Rio de Janeiro: Ed.
Elsevier, 2013, 360 p; Brunetti, R.F.,
Montenegro FLB:
Odontogeriatria – Noções de interesse clínico. São Paulo: Artes
Médicas, 2002, 481p.
Marchini,l;
Montenegro FLB; Ettinger R.E.-A
Odontogeriatria como uma especialidade odontológica no Brasil: O que
foi conseguido depois de 15 anos?Braz
Dent
Sci 2016 Apr-Jun,19(2):10-17
*Zaíra Barros
é jornalista, sócia da Editabr Comunicação e Editora,
integra a diretoria do IPM na área de Comunicação. Editora do Jornal
Odonto.
zairabarros@editabr.com.br |
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